Responsabilidade Social e Talento
Em modo continuação, começo por citar o último parágrafo da minha opinião aqui no Dinheiro Vivo, no mês passado: “Agora que se vive nas grandes empresas uma autêntica corrida às certificações ESG (Environment, Social and Governance), seria muito positivo que os seus líderes reflectissem sobre como podem contribuir para minorar as grandes e graves questões geo-políticas, ambientais e sociais que o mundo enfrenta”.
Depois de a ter expressado participei numa discussão sobre as novas políticas nos negócios que incluía um estudo de caso sobre práticas de ética laboral. Tratava-se de uma empresa de média dimensão do sector têxtil cuja manufactura estava localizada num país com uma ecomomia pouco regulada e com baixos custos laborais. A ideia era então ajudar a empresa a desenvolver uma estratégia que lhe permitisse reposicionar-se antes que o assunto se tornasse político.
A discussão foi interessante pela diversidade de participantes, desde os que manteriam o “business as usual”, passando pelos que iriam comunicar a sua posição através de uma campanha junto de accionistas, clientes e colaboradores, até aos mais pragmáticos, estes com a mente nos custos e benefícios de uma eventual alteração do modelo de negócio. Houve ainda quem pensasse em soluções de longo prazo que passavam por conversações com o governo local, com ONG ou por parcerias com negócios locais que permitiriam outro tipo de actuação naquela geografia. Ainda assim não saí convencida de que alguém se atrevesse a sugerir uma verdadeira disrupção no modelo de negócio. A atmosfera que senti apontava para os receios de que o assunto saltasse para a esfera pública com danos para a imagem e de seguida para os lucros.
Numa época de inflação como a que vivemos e em que somos informados dos lucros de milhões que algumas empresas obtiveram, recordo o recente discurso do secretário geral da ONU, referindo-se ao nosso planeta: “Esta ganância grotesca está a punir as pessoas mais pobres e vulneráveis, enquanto destrói a nossa única casa”, numa clara alusão às empresas de petróleo e gás que estão a registar resultados extraordinários em plena crise energética.
Talvez esta situação possa ajudar a que os empresários possam abrir os olhos ao que se passa com a falta de talento. Não existe falta de talento, existem pessoas, sobretudo entre as gerações mais novas, que tomaram consciência de que precisam de novos modelos de negócio, nem que para tal venham a ganhar menos. Sabemos que os salários em Portugal são baixos e a esse facto é muitas vezes atribuída a falta de mão de obra. Um salário baixo numa empresa com um verdadeiro compromisso com questões ambientais, sociais e de governança é preferível a um salário baixo numa que exibe lucros “grotescos”. É como se a força de trabalho se tivesse apercebido do seu poder e ela própria esteja a nivelar o mercado de trabalho. Recentemente conheci o caso de alguém que se despediu nessas circunstâncias, a ganhar menos, mas numa empresa com outro propósito, palavra cujo significado deve ser relembrado.