O rigor e a pressa
– O que dificulta o rigor?
– A pressa…
– E a necessidade de chegar a uma resposta?
– E achar que as respostas são fáceis e que a resposta é que é bom. O processo de pesquisa, de investigação, de entendimento, isso é que dá gozo. O assumirmos que o não saber, ou saber um bocadinho, a ver como é que é.
Este é um excerto de uma entrevista dada por Hélder Macedo, poeta, ensaísta e escritor – Emeritus Professor do King´s College na Universidade de Londres – à jornalista Isabel Lucas numa edição recente do jornal Público.
Retive esta entrevista por notar que falta de rigor e a pressa são cada vez mais visíveis em diversos sectores de actividade e o desempenho final é, claro, afectado por isso. “O óptimo é inimigo do bom”, “É preciso fazer mais com menos”, “És muito perfeccionista”, são frases que ajudam a construir uma cultura de pressa e de falta de rigor.
A cultura do imediatismo, criada pela era digital, é em grande parte responsável por isso. Por um lado, os consumidores exigem respostas rápidas e produtos ou serviços instantâneos e por outro, a tecnologia e a automação nem sempre garantem qualidade e rigor. Veja-se, por exemplo, as traduções automáticas nas legendas de filmes, séries ou documentários.
A competitividade é outra variável a ter em conta, exercendo uma pressão constante para a redução de custos e os tempos de entrega, além de que o ciclo de vida dos produtos é cada vez mais curto levando as empresas a lançarem, cada vez mais rápido, novos produtos ou actualizações, comprometendo a qualidade.
As empresas que dão prioridade a resultados financeiros de curto prazo em detrimento da sustentabilidade e da qualidade a longo prazo, tendem a criar objectivos de desempenho e indicadores – chaves de desempenho (os chamados KPI’s) focados em quantidades e prazos, em vez de qualidade e rigor. A redução de equipas e de recursos, contribuindo para a sobrecarga de trabalho leva, naturalmente, a que se tenha menos tempo para se ser rigoroso e entregar com qualidade.
O desejo de escalar o negócio, torna muitas vezes essa entrega de qualidade num grande desafio. É olhar, mais uma vez como exemplo, para redes de franchising, cujo crescimento descontrolado compromete, em tantos casos, a qualidade desvirtuando as promessas iniciais.
Há também que contar com o estado actual do mercado de trabalho, caracterizado por uma elevada rotatividade que leva as empresas a não investir na adequada formação. Mas será que o contrário também pode ser verdade? Quando não se aposta no desenvolvimento das equipas e na sua valorização e reconhecimento, a rotatividade é mais alta?
As empresas que equilibram qualidade e tempo, criando métricas de qualidade e rigor além das de quantidade e prazos, que investem na aprendizagem e desenvolvimento e que estabelecem mecanismos de controlo de qualidade, estão a construir uma cultura organizacional de excelência.