O regresso aos escritórios

 Em Cultura de Empresa, Employer branding

O presidente de uma empresa dizia-me que, pela primeira vez desde há muitos anos, tinha conseguido fazer um mês completo de férias, embora sempre ligado ao email. A ele, em conversas que vou tendo, junta-se um número significativo de pessoas a ocupar diferentes níveis funcionais nas empresas onde trabalham e que, ao contrário do presidente, se mantiveram desligadas de mensagens e correio electrónico. Três semanas pelo menos, dizem-me. A submersão em ferramentas tecnológicas que o trabalho remoto induziu, a que acrescem todos os desvarios causados por quase dois anos de pandemia, levou as pessoas à exaustão.

Falo ainda com algumas pessoas com cargos de maior ou menor responsabilidade e de diferentes idades que ponderam sair das empresas onde trabalham, umas sem alternativa à vista, outras a pensar em negócios próprios. O que é que as leva a tal? Na maioria dos casos o desejarem uma vida em que a pressão por resultados não seja uma constante, em que sejam colocados limites ao conseguir sempre mais e mais. A pandemia obrigou à reflexão e sobretudo os mais jovens olham para o mundo do trabalho de maneira diferente.

É neste contexto que, num artigo da revista New Yorker, me deparo com o livro de Paul Jarvis, designer e consultor de tecnologia, Company of OneWhy Staying Small is the Next Big Thing for Business, cujo conteúdo questiona o crescimento a qualquer custo e se debruça sobre a redução do stress como alternativa a fazer crescer o negócio. Claro que o mundo não está preparado para viver de empreendedores com pequenos negócios e o crescimento faz parte da sua natureza num mundo competitivo, mas torna-se recorrente a ideia de estarmos preparado para travar a obsessão por resultados e o impacto que essa ganância tem quer nas pessoas, quer no planeta.

Parece que trabalhamos mais do que o tempo que temos e, mais uma vez, o trabalho remoto mostrou-nos isso mesmo: há sempre um “já agora”, para responder a mais um email fora de horas ou tratar de mais um assunto. Ora, segundo o artigo da NY, parece que quando ultrapassamos em 20% o tempo que temos a trabalhar, o stress gerado passa a ser persistente (à semelhança daqueles quilos que se ganham quando ultrapassamos a quantidade de calorias ingeridas em relação às que conseguimos gastar). Ou seja, se ultrapassarmos as 48 horas por semana os danos podem surgir, sendo que, há pessoas que se vangloriam de trabalharem muitas mais horas como se qualquer momento de pausa possa ser visto como uma irresponsabilidade.

Neste momento muitas empresas adoptam a semana de trabalho de quatro dias e é louvável o espírito que preside a essa decisão, sobretudo quando o quinto dia pode ser escolhido pelas pessoas. Mas é preciso bom senso na distribuição das oito horas do quinto dia pelos restantes, ou até na possibilidade de ultrapassagem dessas horas sob pena de o efeito ser pernicioso.

Numa época em que a busca das empresas por talento continua a ser um tema, dada a dificuldade em encontrá-lo – não só pela falta de qualificações mas também porque as pessoas querem trabalhar em organizações que lhes permitam ter um trabalho com significado e em que possam desenvolver-se de maneira equilibrada – chegou a altura de pensar que limites estão as empresas dispostas a estabelecer para si próprias.