Na zona de desconforto com apoio
Tenho acompanhado duas séries, Billions e Blunt Talk, a primeira uma ficção contemporânea à volta do universo dos hedge funds, a segunda uma comédia que tem como cenário um canal de televisão. Em ambas surge um personagem que assume o papel de ‘psi’ dos que trabalham naquelas organizações e que faz parte do head count. Podemos ver esse personagem como psicólogo, terapeuta, coach, alguém que presta apoio em momentos de tensão quer para a organização quer para uma pessoa específica.
Dei comigo a pensar se será uma tendência nos EUA ou apenas ficção. Mas como é cada vez mais frequente ficção e realidade andarem juntas, parece-me ser uma ideia que podia ser importada para o mundo empresarial português.
E tratando-se estes personagens de alguém que está lá em momentos difíceis e que, naturalmente, mantém a confidencialidade, não é menos verdade que, sobretudo no primeiro caso, é alguém que está alinhado com o negócio uma vez que vive a organização por dentro.
Vem isto a propósito de uma reflexão sobre o motivo manifesto dos pedidos de coaching com que me tenho confrontado e sobre aquilo que encontro como motivo latente. Fazer uma distinção entre business coaching e coaching pessoal não faz sentido já que são inseparáveis.
Desenvolver competências de liderança ou de comunicação, habilidades de comunicação interpessoal, neutralizando agressividade ou passividade, instigar à proactividade ou a deixar cair a centralização do poder fomentando a delegação, alimentar a colaboração e a cooperação entre as pessoas, são pedidos que posteriormente deixam a descoberto a personalidade do alvo de coaching, mas também a da empresa ou seja, a sua cultura.
As relações dentro de uma organização podem ser olhadas como as relações familiares: há pais e filhos, irmãos, padrinhos, padrastos e madrastas… isto é, toda uma reprodução de situações já vividas a que se junta o mundo em que hoje vivemos: complexo, competitivo, volátil, pautado pela incerteza e pela ambiguidade. Um mundo gerador de insegurança e em que é fácil perder a confiança daqueles e naqueles à nossa volta.
As margens da maioria dos negócios são cada vez menores o que leva a que o trabalho de três seja feito por um. A rapidez com que o mundo gira, a quantidade de informação que é preciso processar e as decisões que têm de ser tomadas – paradoxalmente com pouca informação – num curto espaço de tempo, fazem o resto: muitas pessoas nas organizações estão perdidas e exaustas.
Qual é o papel de alguém que, ao mesmo tempo que pertence ao negócio está à margem dele, parece ser o destes personagens que clarificam o que é ambíguo, simplificam o que é complexo e sobretudo criam uma zona de segurança e de conforto. Sim, as pessoas ficam cansadas e improdutivas se estiverem permanentemente na zona de desconforto. Sobretudo sem apoio.