E se contratasse uma pessoa com experiência de doença mental?
Fui convidada pela AEIPS para lhes falar de gestão de talento. Esta instituição de solidariedade social tem como objectivo a ‘promoção de iniciativas no domínio da integração psicossocial, visando prioritariamente pessoas com experiência de doença mental’. Uma das iniciativas que a AEIPS leva a cabo é o apoio aos utentes para encontrarem um estágio numa organização e em alguns casos um emprego.
Confesso que senti alguma apreensão com este convite que tinha como fim, num primeiro momento, falar para pessoas com doença mental acerca da maneira como podem revelar o seu talento e a seguir, para os técnicos acerca de como podem detectar o talento.
Num mercado em que há cada vez menos trabalho e o que existe é cada vez mais exigente em termos de qualificações, por força da evolução tecnológica, tornando a ‘guerra pelo talento’ cada vez mais feroz, como é que pessoas com doença mental encontram oportunidades?
A verdade é que me deparei com pessoas inteligentes e com uma enorme vontade de aprender e de desenvolvimento, curiosas, a fazerem perguntas muito pertinentes e algumas com formação académica superior. Características que fazem parte do rol que habitualmente gostamos de ver num candidato.
Os Técnicos desta Instituição têm vindo a desenvolver um trabalho exemplar, quer no apoio diário aos utentes, quer na busca de empresas ou organizações que estejam disponíveis para integrar pessoas diferentes. Tudo isto, com muita criatividade e com recursos limitados.
Tem havido alguns casos de sucesso (o sucesso é medido pela efectivação de um estágio mais do que a de emprego, visto que o importante é que as pessoas tenham a experiência de uma vida com sentido fora da instituição), como o da pessoa que foi contratada por 3 meses e acabou por ficar 9 meses. Ainda assim, as empresas que integram pessoas com experiência de doença mental, tendem a adoptar uma atitude condescendente para com elas, de que é exemplo o esquivarem-se a dar-lhes feedback quando algo corre menos bem. A ideia não é essa, pois – à semelhança do que acontece com colaboradores que não têm doença mental – só se pode corrigir a execução de uma tarefa, um comportamento ou uma atitude quando há consciência do erro. Caso contrário gera-se confusão e como me dizia um dos utentes: ‘ a doutora, nas empresas deve ver pessoas mais malucas do que nós’.
Numa altura em que temas como a ‘diversidade’ e a ‘responsabilidade social’ estão na ordem do dia no discurso das empresas, é importante que se reflicta sobre o verdadeiro significado dessas palavras. Porque a diversidade não é só de género, de raça, de religião ou de orientação sexual. A diversidade pode integrar pessoas com uma estrutura mental diferente (já agora, algumas delas a pensarem ‘fora da caixa’) e a responsabilidade social não é só pintar casas ou alimentar os sem abrigo, acções louváveis mas que ficam na rua. A responsabilidade social também pode ser trazer pessoas diferentes para dentro da organização.