Culpa ou responsabilidade?
A nossa cultura judaico cristã torna difícil que nos libertemos da culpa. A noção de culpa surge bem cedo na nossa vida, basta lembrarmo-nos do apontar de dedo nas brincadeiras de crianças: “não fui eu, foi ele”. Se nas primeiras vezes em que este comportamento surge o adulto o corrigir, poderá estar aberto o caminho para o início de uma relação saudável com a noção de responsabilidade.
Vem isto a propósito de um trabalho académico, levado a cabo pela Universidade da Califórnia e da Nanyang Technological University de Singapura, que conclui que as pessoas em posições de poder tendem a culpar os que cometem erros e a percepcioná–los como possuindo os mecanismos para poder escolher entre errar e não errar. Ora, este comportamento facilmente concorre para a construção de uma cultura de fuga ao erro dentro de uma organização. E quando as pessoas fogem a sete pés do erro, o que geralmente acontece é o bloqueio, a inacção e o “quem quiser que tome decisões que a mim não me apanham”. Isto, apesar de se apregoar que errar é humano, só não erra quem não faz, que o que importa é aprender com o erro e outros chavões que na prática são postos de lado quando o erro, sobretudo grave, acontece.
Recentemente, tive oportunidade de estar presente, como observadora, numa reunião de dirigentes de uma empresa em que um dos temas era um acidente grave ocorrido na planta de produção. É preciso dizer que a empresa tem uma política de segurança extremamente rigorosa em que um dos mandamentos sempre presente é, “se para produzir põe a sua segurança em causa, não produza”.
A maneira como foi feita a análise do acidente, exposto pelo seu responsável, foi a todos os títulos notável. Porquê? Porque as perguntas feitas pelo Director Geral e pela sua equipa foram no sentido de encontrar a origem do acontecido. Em que estado estava o equipamento? A pessoa estava a utilizar os meios de protecção obrigatórios? Se o equipamento estivesse a funcionar a 100% o acidente poderia, ainda assim, acontecer? Jamais a palavra culpa foi pronunciada mesmo se as consequências implicassem a atribuição de uma responsabilidade, uma vez que são as pessoas que operam as máquinas. Mas a causa daquele erro será eliminada e as pessoas envolvidas poderão vir a cometer outros, não o mesmo. É isto que precisamos acrescentar aos chavões sobre errar: “como posso não cometer o mesmo erro segunda vez?”